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sábado, 25 de setembro de 2010

Macacos, Clarice Lispector

M A C A C O S
 Clarice Lispector
Por Lucas Suzuki
Era Ano Novo e o meu presente tinha acabado de entrar pela porta. Para minha surpresa não era um brinquedo novo, mas sim um MICO. Ele entrou rápido pela porta comendo bananas e examinando tudo o que via, balançando seu longo rabo. Subia e descia pelos varais e dava berros e gritos, jogando as casas de banana por todo lado.
Meu menino menor sofria com o medo de que o macaco morresse e eu passei a ser a responsável por cuidar do macaco e por não permitir que nada de ruim acontecesse a ele. Mas um dia, uma amiga minha vendo toda a minha preocupação pelo macaco, levou-o embora e o entregou a uns meninos que viviam no morro próximo a minha casa.
Um ano depois, passeando por Copacabana vi uma multidão. Aproximei-me e vi que um homem vendia macacos. Lembrei dos meus filhos e imaginei como ficariam caso ganhassem outro macaco de estimação. Porém, não era um simples macaco, era uma macaca: Lizette.
Lizette era pequenininha e mal cabia na palma da mão. Tinha saia, brincos, colar e pulseira de baiana, além de olhos redondos, grandes, vivos.
Lizette era toda delicada, doce, jamais desarrumava suas roupas e adorava o colar vermelho brilhante que carregava em seu pescoço. A macaquinha também adorava dormir, mas era terrível para comer… tinha preguiça de comida. Os meninos a adoravam e como carinho recebiam mordidinhas de leve, como forma de afeição.
No terceiro dia em que Lizette estava em nossa casa reparei nos seus gestos um ar de lerdeza e suavidade além da conta. Pensei: mas isso não é suavidade, isso é morte.
Percebi naquele momento que Lizette estava partindo e chamei meus meninos e contei o que acabava de descobrir.
Vi meus filhos tristes e naquele instante percebi até que ponto nosso amor por ela teria chegado. Enrolei Lizette num guardanapo e fui ao hospital mais próximo.
No hospital eu olhava para Lizette, mas não a reconhecia. Aqueles grandes olhos que havia citado, agora eram pequeninos e exaustos. O médico lhe dava oxigênio e Lizette desejava reagir, mas não conseguia.
O enfermeiro que ali estava disse-me de forma rude de que Lizette não sobreviveria e ainda sim, censurou-me alertando-me sobre ter comprado macaco na rua…
Voltei-me para os meus meninos e ficamos em silêncio por um segundo. Decidimos que se o enfermeiro a curasse, ele poderia ficar com ela como prêmio pelo grandioso trabalho.
O enfermeiro olhava para Lizette e dizia que ela era bonita. Levantava seus braços, mexia em suas perninhas e ela quase não respondia. Olhou, olhou e mesmo após a proposta disse-me que Lizette era nossa, e que não a queria.
Fomos embora de guardanapo vazio e no dia seguinte ligaram para nossa casa informando que Lizette tinha acabado de morrer.
Meu menino mais novo olhou-me nos olhos e perguntou:
- Você acha que Lizette morreu de brincos, mamãe?
-Sim – respondi.
Uma semana depois meu filho mais velho disse:
-Mãe, você se parece tanto com a Lizette.
-Eu também gosto de você – respondi.





Desenho animado Macados
Desenho animado MacadosAdaptação do Conto Macacos, Clarice Lispector

A ESCOLA E O PRECONCEITO, por ROSELY SAYÃO

Hoje, vazia de sentido, a expressão: "educação para a cidadania", que não sai do discurso, precisa ser honrada.
  Leia matéria em: 
http://migre.me/1bNsh

Fernando Pessoa

“Quem não vê bem uma palavra, não pode ver bem uma alma”
 
                                                                                                                                  Fernando Pessoa

Perguntas de um trabalhador que lê, de Bertold Brecht

PUPIM, Selma C. Freitas 


        PERGUNTAS DE UM TRABALHADOR QUE

Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão nomes de reis.
Arrastaram eles os blocos de pedras?   
E a Babilônia várias vezes destruída
Quem a construiu tantas vezes? Em que casas
de Lima radiante dourada moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros na noite em que
a Muralha da China ficou pronta?
A Grande Roma está cheia de arcos de triunfo.
Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os césares? A decantada Bizâncio
Tinha somente palácios para seus habitantes?
Mesmo na lendária Atlântida
Os que se afogavam gritavam por seus escravos
Na noite em que o mar tragou.
O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Sozinho?

Bertold Brecht foi poeta e dramaturgo alemão; nasceu em 10/02/1898, em Augsburg,   Alemanha e faleceu em 15/08/1956, em Berlim,no mesmo pais.

Considerações Iniciais

“A história é feita pelos homens, ao mesmo tempo em que nela vão se fazendo também”.
Paulo Freire

As epígrafes sugerem relevantes reflexões à elaboração de qualquer escrita. Dessa forma, voltar no tempo é preciso, visto que as características da realidade exigem uma determinada volta ao passado. Todo fato atual retoma o passado como identidade e como ponto de partida para explicar fatos da atualidade.
Sob esse aspecto, as civilizações apresentam como marco inicial a palavra escrita, representada como testemunho mais eloquente de qualquer cultura. Segundo o historiador Marc Bloch, a definição de história incide numa Ciência dos homens através do tempo e, desse modo, esse conhecimento só poderá ser compreendido como estrutura social de forma a algo relacionado entre os homens, suas ações e significações. De todo modo, tais ações deverão abranger grupos e a história, como ciência, deverá sempre ser constituída por um fato e, sobretudo por um homem.
Ao longo do tempo, a história se ocupou dos grandes acontecimentos, dos grandes nomes e heróis; sendo que, o essencial de todo o processo: os que realmente a construíram, a grande massa muda, a essência de toda historicidade, ou seja, aqueles que verdadeiramente edificaram uma história permaneceram no anonimato.
Estudos divulgados mostram que, no século XIX, com o surgimento de uma Nova História, passou-se a dar relevância a todos os atos humanos, enriquecendo a reflexão histórica, tirando-a de seu isolamento e aproximando-a às outras ciências, de forma a estudar o homem em sua globalidade, já que o fundamento dessa abordagem histórica é a própria historicidade humana. Contudo, os homens que a construíram ainda não são considerados personagens dessa construção.
 Nesse mesmo sentido, o homem é um ser do tempo com existência em cada sociedade, com condição de possibilidade de se inserir no processo histórico, não podendo dessa forma, o que denominamos História, atribuir valores somente aos grandes nomes.
Dessa forma, esta pesquisa busca colaborar para a continuidade do trabalho no Ensino da História, sob a perspectiva de consolidar novas práticas pedagógicas, contribuindo para que, um número maior de sujeitos históricos, saia do anonimato e passem a construir junto aos grandes nomes a História da Humanidade. Diante disso, compreender a importância da disciplina de História na construção da cidadania dos diversos sujeitos sociais, além da importância dos conhecimentos históricos como base para participação ativa e consciente na sociedade.
O poema de Brecht nos faz refletir sobre a função social de uma obra escrita, quer por autores, quer por historiadores e  contempla as relações entre literatura e história, bem como o contexto histórico em que a mesma foi escrita. Em síntese, a proposta deste artigo consiste em contribuir com o vínculo estabelecido entre História e Literatura, no sentido de apontar desafios teóricos e metodológicos decorrentes da interpretação da realidade, ao mesmo tempo em que observamos o ressurgimento da narrativa, exigindo uma resposta de historiadores e literatos no atual momento.
A partir de fatos registrados na história da humanidade, o poema Perguntas de um trabalhador que lê, de Bertold Brecht, utilizado como corpus nesta análise, insere reflexões, no sentido de instigar a forma pela qual o poeta poderá contribuir para uma nova abordagem do ensino de História. Face à dimensão pedagógica conferida pelo autor, em suas obras, contemplaremos novos segmentos que possam estimular o pensamento crítico de seu público leitor. Espera-se, com isso, ampliar os estudos literários a partir da história, situá-los na contemporaneidade de forma a afirmar o papel da história para a formação do leitor, numa perspectiva interdisciplinar em textos literários. Em suma, apreciar as tendências históricas na Literatura, a influência da historicidade dos fatos e sua ação na construção histórica da sociedade, considerando o momento atual em que vivemos.

O que chamamos de História

Chamamos de História, a experiência humana partilhada por cada um dos homens e por toda a humanidade. Desse modo, corresponde à História, a tradição oral, os usos e costumes, os documentos escritos, os objetos e demais sinais humanos, que denotam vestígios de experiências vividas.
Olhar para a história é olhar sobre o passado como um recorte. A reconstituição da memória das experiências vividas exige uma crítica cuidada dos testemunhos e, diante disso, cada história produz uma leitura própria por quem a contou.  O historiador, perante o escasso acesso ao passado em sua totalidade, posto que essa memória se mostra um tanto fragmentada, se encontra diante de uma história fragmentada.
É bom lembrar que, a história presente na escola é a que chamamos de tradicional, produzida por uma burguesia triunfante a partir da Europa, pela garantia de seu poder e pelo culto aos heróis. Na medida em que o predomínio da burguesia-capitalista não foi superado, a história que lhe interessa persiste. É dessa forma, que na história contada, justificam-se os interesses.
O fato maior, é que os sujeitos sempre estiveram presentes na história. E, de certo modo, para a atualidade, todo fato ocorrido em eras remotas passa a construir a história. A experiência, o cotidiano, a vida dos que não têm voz, nem nunca tiveram vez, acaba por tornar a história contada um exercício intelectual de transformação social. Por certo, não cabe ao historiador produzir um projeto de sociedade, sua tarefa consiste em olhar e ler a experiência vivida. 
A história real foi escrita pela sociedade, sendo que, ao historiador cabe reconstituí-la, preservando-se a memória do acontecido, mesmo que lhe faltem fatos que a justifique e, muito embora, com toda a obliqüidade possível.

 Literatura e História

A Literatura representa um privilegiado instrumento no sentido de vislumbrar o passado do mundo. Muito embora a Literatura não seja considerada História, a disciplina desempenha o relevante papel de mediadora entre os povos que se distanciaram no tempo.
De igual forma, a ficção relata, por meio de personagens, usos e costumes, os testemunhos, reflexões, opiniões vivenciadas em tempos remotos. Além da imagem da época, relata-se também a idéia que se tem do futuro.
A partir disso, na medida em que deixa de ter sentido uma teoria geral de interpretação dos fenômenos sociais, apoiada em idéias e imagens  do presente e antecipadoras do futuro das civilizações, ocorre uma segmentação das ciências humanas e um movimento paralelo de associação multidisciplinar em busca de saídas.
Assim, mesmo a literatura produzida sem um compromisso com a verossimilhança dos fatos, constrói um mundo que se contrapõe ao mundo real, é inegável que, através dos textos artísticos, a imaginação produz imagens, e o leitor, no momento em que, pelo ato de ler, recupera tais imagens, encontra uma outra forma de ler os acontecimentos constitutivos da realidade que motiva a arte literária.
No mais, são notáveis os períodos que compreendem os estudos poéticos da Antigüidade, as pesquisas estéticas do Romantismo e as novas propostas teóricas ao longo do século XX, que vieram a se tornar a opção teórica de inúmeros pesquisadores nesse fim de século.       
O historiador, portanto, deve se apropriar da noção de intriga, elaborada pela ficção, recurso que possibilitará uma compreensão aberta do real. É o narrador, através de sua intriga, que faz emergir do esquecimento a matéria desordenada de acontecimentos do real, pois atribui sentido aos fatos.
Assim, ao escolher  os fatos que merecerão destaque na construção de suas tramas, o historiador não deixa de inventar, à sua maneira.
Dessa maneira concebidas, historiografia e narrativa de ficção são formas de conhecimento do mundo, em sua temporalidade, o que levaria a contestar tanto as noções puramente estéticas da literatura quanto a idéia da escrita da história como discurso científico de natureza oposta à narrativa.
 Com a proposta  de refletir sobre literatura na perspectiva da história social, levando em consideração o aspecto tempo, tanto para o acontecimento quanto como para seu relato, tomemos o pensamento Benedito Nunes, no que se refere a narrativa ficional e História:


 [...] narrar é contar uma história, e contar uma história é desenrolar a experiência humana do tempo. A narrativa ficcional pode fazê-lo alterando o tempo cronológico por intermédio das variações imaginativas que a estrutura auto-reflexiva de seu discurso lhe possibilita, dada a diferença entre o plano do enunciado e o plano da enunciação. A narrativa histórica desenrola-o por força da mímeses, em que implica a elaboração do tempo histórico, ligando o tempo natural ao cronológico. (NUNES, Benedito. 1988, p. 9-35)


Nesse contexto, Roland Barthes em O rumor da língua, questionou sobre a veracidade dos fatos no discurso histórico, considerando sua própria existência lingüística. Para Barthes, a história deve ser vista, se não como ficção, pelo menos como discurso, visto que narração e história se diferem realmente, por algum traço específico, por uma pertinência incontestável, da narração imaginária. Contudo, o estudo das características fundadoras do discurso histórico responde que, do ponto de vista da estrutura, ambas as narrativas compartilham de diversas características.

A Influência da História na Contemporaneidade

“Ninguém pode ser um caderno vazio, todos nascem para contribuir e transformar a história”                         Paulo Freire

Uma das questões que norteiam o tempo refere-se ao percurso que se desloca do presente em direção ao passado. Em razão disso, todo momento presente consiste na realização dos acontecimentos ocorridos anteriormente, uma vez que, o vivido se dilacera entre o passado e o futuro e, voltar na história significa um minucioso estudo do outrora transformado no hoje. 
Nessa perspectiva, conforme salientado anteriormente, verifica-se a formação das relações sociais, assim como o poder da literatura como um instrumento privilegiado para vislumbrarmos o passado do nosso mundo que nos cerca.
Antonio Candido, com riqueza intelectual, reafirma, através do seu texto Literatura e Sociedade (1967), o preponderante papel que a história desempenha na análise de uma obra literária. O estudioso examina a influência do meio social sobre a obra de arte e a domínio desta sobre o meio, diante disso, coloca a literatura como uma relação inextricável, do ponto de vista histórico e, estabelece entre ambas uma afinidade que incorpora valores do comportamento do homem primitivo e do civilizado, dos quais depende a intemporalidade e a universalidade.
Nessa postura, a história fortalece nossas relações com a cultura dos cidadãos oferecendo-lhes informação dos acontecimentos expressivos que marcaram a humanidade e que são essenciais para a formação da cidadania de um povo.
Segundo Candido, a função histórica ou social de uma obra depende da sua estrutura literária e esta decorre de verificações centradas nos fatos históricos. Nesse contexto, as tendências historicistas, marcadas de relativismo, encontram na literatura uma conseqüência direta dos fatores do meio e da época, que cada povo possui e que à História cumpre exercer.  As manifestações literárias se vinculam ao contexto histórico de cada época, assim não existe literatura sem história e esta caminha a lado daquela.
A literatura tem adquirido uma função mediadora, considerando o grau de parentesco que a ela lhe foi atribuída, dada as relações estabelecidas com a História. Muito embora, a Literatura não seja a História, propriamente dita, conferem-lhe laços consanguíneos de prima-irmã da História.
            Assim considera Walter Benjamin,

O romance acompanha o homem constante e fielmente desde o princípio dos tempos modernos. A “paixão de conhecerse apossou dele então para que ele possa indagar  a vida concreta do homem e a proteja contra o “esquecimento do ser” para que ele mantenha o “mundo da vida” sob uma iluminação perpétua. [...] Descobrir o que somente um romance pode descobrir é a única razão de ser de um romance. O romance que não descobre uma porção até então desconhecida da existência é imoral. O conhecimento é a única moral do romance (BENJAMIN, 1975).

A partir desses apontamentos, cabe relevar as considerações claras do autor Bertold Brecht , em seu poema Perguntas de um Trabalhador que Lê. O poema em análise denuncia de um modo sutil, a insignificância de personagens, cuja história constituíram peças imprescindíveis. Ao edificar grandiosos monumentos eternizados pelo tempo, permaneceram no mesmo anonimato, antes e depois das maravilhas criadas e dos feitos se efetivarem como A História da Humanidade. 
Entre os grandes poetas, que souberam incorporar, em seu trabalho, um compromisso social explícito à linguagem de seus versos, está Bertolt Brecht, poeta alemão, nascido a 10 de fevereiro de 1898, em Augsburgo e falecido em 14 de agosto de 1956, em Berlim Oriental. Eugen Berthold Friedrich Brecht foi um dos mais importantes autores, dramaturgo e poeta da Alemanha do século XX. De formação marxista, Bertolt Brecht, como era conhecido, dava grande importância à dimensão pedagógica das suas obras teatrais: contrariando a passividade do espectador, sua intenção era formar e estimular o pensamento crítico do público.
Para tanto, servia-se de efeitos de distanciamento, como máscaras, intervalos musicais ou painéis nos quais se comentava a ação. Brecht expôs em seus escritos uma nova forma de entender o teatro. Brecht expôs sua obra literária e teatral a serviço da política; começou a escrever cedo e publicou seu primeiro texto num jornal em 1914.
Sua obra foi uma das que mais impacto teve na cultura brasileira. Os primeiros tradutores do poeta se concentraram em sua mensagem poética e, dessa forma, o poeta Haroldo de Campos, um incansável idealizador de formas poéticas fortes, foi o primeiro a traduzir suas obras. Como de hábito, Haroldo traduziu a poesia de Brecht, no mais alto grau com compromissos éticos e estéticos. Estas traduções provocaram um grande impacto ao revelar um autor conciso, de retórica despojada.
De fato, o poeta, certamente, ocupa um lugar peculiar na poesia ocidental moderna, visto que sua contemporaneidade se faz observar por meio de um sábio retrocesso anacrônico, cuja alquimia verbal autônoma é procedente de fontes orientais antigas, mais precisamente, a Bíblia e a literatura chinesa clássica.
Quanto à forma poética escolhida pelo autor, observa-se a elaboração de elementos simples, o que lhe permite a veiculação de mensagens claras e de fácil entendimento. Haroldo de Campos traduziu um dos mais expressivos poemas do autor, Fragen eihes lesenden Arbeiters, Perguntas de um Trabalhador que Lê, reproduzido a seguir. No poema em análise, o autor destaca a influência babilônica nas obras de poetas gregos como Homero e Hesíodo, na geometria do matemático grego Euclides, na astronomia, astrologia, heráldica e na Bíblia. Conforme já salientado, fatos marcantes, como  grandes monumentos, a Muralha da China, cuja construção, acredita-se ter ocupado a mão-de-obra de cerca de um milhão de homens, sendo que, duzentos e cinqüenta mil teriam morrido durante a sua construção, entre soldados, camponeses e cativos.

Fragen eines lesenden Arbeiters

Wer baute das siebentorige Theben?
In den Büchern stehen die Namen von Königen.
Haben die Könige die Felsbrocken herbeigeschleppt?
Und das mehrmals zerstörte Babylon —
Wer baute es so viele Male auf? In welchen Häusern
Des goldstrahlenden Lima wohnten die Bauleute?
Wohin gingen an dem Abend, wo die Chinesiche Mauer fertig war
Die Maurer? Das große Rom
Ist voll von Triumphbögen. Wer errichtete sie? Über wen
Triumphierten die Cäsaren? Hatte das vielbesungene Byzanz
Nur Paläste für seine Bewohner? Selbst in dem sagenhaften Atlantis
Brüllten in der Nacht, wo das Meer es verschlang
Die Ersaufenden nach ihren Sklaven.
Der junge Alexander eroberte Indien.
Er allein?
Cäsar schlug die Gallier.
Hatte er nicht wenigstens einen Koch bei sich?
Philipp von Spanien weinte, als seine Flotte
Untergegangen war. Weinte sonst niemand?
Friedrich der Zweite siegte im Siebenjährigen Krieg.
Wer Siegte außer ihm?
Jede Seite ein Sieg.

 Perguntas de um Trabalhador que lê

“Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão nomes de reis.
Arrastaram eles os blocos de pedras”?
E a Babilônia várias vezes destruída
Quem a construiu tantas vezes? Em que casas
de Lima radiante dourada moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros na noite em que
a Muralha da China ficou pronta?
A Grande Roma está cheia de arcos de triunfo.
Quem os ergueu? Sobre quem triunfaram os césares?
A decantada Bizâncio tinha somente palácios para seus habitantes?
Mesmo na lendária Atlântida
Os que se afogavam gritavam por seus escravos
Na noite em que o mar tragou.
O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Sozinho?

A cidade que os gregos chamaram Tebas é denominada Uaset no Egito. Tebas recebeu o nome de cidade-estado grega, antiga aliada de Esparta.
Entre os pequenos vales da montanha tebana, o Vale das Rainhas apresenta numerosas vantagens, como o fato de possuir o único acesso transitável por pesados comboios e de ser dominado por montanhas de todos os lados, logo, fácil de ser vigiado do alto por uma equipe reduzida. Finalmente, o ponto mais elevado, em sua extremidade sul, tem a forma de uma pirâmide.
A civilização babilônica existiu do século XVIII ao VI a.C. O país era constituído por doze cidades, cercadas de povoados e aldeias. No alto da estrutura política o monarca absoluto, a figura do rei, exercia o poder legislativo, judicial e executivo. Abaixo dele havia um grupo de governadores e administradores selecionados. Na atualidade essa região é pertencente ao Irã e Iraque, países do Oriente Médio.
Os babilônios modificaram e transformaram sua herança suméria para adequá-la a sua própria cultura e maneira de ser dos países vizinhos, especialmente o reino da Assíria, que adotou praticamente por completo a cultura babilônica.
A Grande Muralha é uma impressionante estrutura de arquitetura militar construída durante a China Imperial. Na realidade, trata-se de diversas muralhas, construídas por várias dinastias ao longo de cerca de dois milênios. Se, no passado, a sua função foi essencialmente defensiva, no presente constitui um símbolo da China e uma procurada atração turística.
 Acredita-se que os trabalhos na muralha ocuparam a mão-de-obra de cerca de um milhão de homens, sendo que, duzentos e cinqüenta mil teriam morrido durante a sua construção, entre soldados, camponeses e cativos.
Calcula-se que a Grande Muralha tenha empregado cerca de trezentos milhões de metros cúbicos de material, o suficiente para erguer cento e vinte pirâmides ou um muro de dois metros de altura em torno da Linha do Equador. A Muralha da China após concurso informal internacional em 2007, foi considerada uma das Novas Sete Maravilhas do Mundo.
  Por volta do século XVI perdeu a sua função estratégica, vindo a ser abandonada. A magnitude da obra, entretanto, não impediu as incursões de mongóis, xiambeis e outros povos que ameaçaram o império chinês ao longo de sua história.  
O poema toma sentido completo nos dois últimos versos, em que o poeta oferece a “solução” final para o seu questionário, ou melhor, os seus questionamentos, com uma  transparente retórica,  mas a conclusão final apenas sugerida. Brecht sugere  que “as massas fazem a história”. A sugestão vem por meio de uma linguagem coloquial, cujo  objetivo é precisamente o de provocar as perguntas do operário, este efeito dificilmente pode ser recriado em português com a mera transposição dos termos alemães. Com um  vocabulário  simples, se constata uma competente alternância entre coloquial e culto. Quanto ao tradutor  Haroldo de Campos, se nota uma preferência por algumas alterações, contudo o efeito poético é preservado.
Todo o poema de Bertold Brecht é construído com uma série contínua de questionamentos entre diferentes acontecimentos narrados sobre os grandes monumentos mundiais: a construção da Muralha da China, dos arcos do triunfo romanos e dos palácios, descritos como tendo sido realizados pelos mesmos sacrificados anônimos de sempre.
 Para o poeta, a história registra apenas aqueles considerados grandes heróis, ou seja, “os Césares”, “Alexandre, chamado de grande”, as fortalezas construídas, no entanto, as pessoas simples,  que fazem a História, sequer são citadas nos livros que registram esta história.
Para começarmos nossa reflexão sobre a história, procuramos ponderar sobre seu papel enquanto disciplina escolar e pensá-la também integrada à área de conhecimento das Ciências Humanas, numa perspectiva interdisciplinar, um diálogo entre as diversas áreas do conhecimento. De forma a refletir o papel da história na formação do leitor, enquanto disciplina escolar, bem a sua integração, numa perspectiva interdisciplinar nos textos literários.
Este estudo da história possibilita ampliar nosso ponto de vista sobre as problemáticas contemporâneas, podendo situá-lo nas categorias de temporalidade e espacialidade e refletindo sobre rupturas e continuidades, necessárias ou possíveis.
A História também possibilita o repensar do papel do indivíduo, inserido em uma determinada sociedade, permitindo que se perceba sua ação como agente transformador e também seus condicionantes sociais, produtos da própria construção histórica.
Para que a própria reflexão sobre a disciplina História possa ser contextualizada, é importante que consideremos o momento atual que estamos vivendo. Vamos refletir sobre o papel da História num mundo globalizado, com um processo de mundialização da cultura e transformações tecnológicas que ocorrem de forma cada vez mais vertiginosas.
Nossa época vive um intenso questionamento de paradigmas da modernidade, de questionamento da racionalidade, do predomínio da Ciência. As bases de sustentação da nossa sociedade estão sendo repensadas, visto que o projeto de desenvolvimento da modernidade não apresentou os resultados que propagava, não minimizou a miséria, as desigualdades sociais e a intensa exclusão social.
Portanto, os conhecimentos de História devem ser inseridos nesse contexto, de incerteza, de desafios, que vem exigindo dos educadores uma reflexão profunda, posicionamentos éticos e compromisso político com uma sociedade mais justa, igualitária e com uma educação menos utilitária, preocupada apenas com os interesses do mercado e marcada por uma concepção armazenada dos conhecimentos escolares.
O debate sobre o campo de conhecimento da História tem se intensificado nas últimas décadas, ocorrendo uma maior aproximação entre o conhecimento histórico escolar – a História que se ensina e a produção acadêmica. Grupos e classes sociais que antes estavam distantes dos estudos historiográficos, que estavam silenciadas, têm sido inseridos nos debates, com novas abordagens sobre temas antigos. Hoje, a história social e cultural tem colaborado na reconstrução e rearticulação da história econômica e política.
Os estudos historiográficos têm redimensionado a importância do cotidiano, tanto na esfera pública quanto privada e, nesse contexto, repensado o papel dos indivíduos em sua dupla faceta de agentes transformadores e de seres históricos condicionados pelas estruturas existentes. Esses estudos debruçam-se sobre as rupturas advindas com o processo da urbanização, da industrialização, das transformações tecnológicas, mas também procura investigar e compreender as mentalidades e as permanências de crenças e valores.
Procura-se a superação de uma investigação histórica que considere somente a utilização da escrita como fonte documental. A pesquisa histórica também se debruça hoje sobre a importância da oralidade humana, do gestual, do pictórico. Considera-se a pluralidade de sujeitos, de vozes, modificando-se a noção de uma história pautada somente em grandes narrativas e eventos, em grandes personagens e heróis.
A gama de estudos historiográficos atuais aponta para a possibilidade de novas intervenções no processo de ensino e aprendizagem dos conhecimentos históricos, em uma nova compreensão da transposição de conteúdos. Apontam para a construção de um processo de ensino pautado na interdisciplinaridade, no “atravessamento de fronteiras” entre as diversas áreas do conhecimento, onde os estudos sobre Antropologia, Sociologia, Filosofia, Geografia, Política podem contribuir e enriquecer o debate e as práticas sobre o ensino de História.
O ensino de História deve fortalecer a construção da cidadania, da noção de importância da coletividade, de construção da identidade e de pertencimento a uma sociedade, a um grupo social, a uma cultura.
As noções de diferença e semelhança, do “eu” e do “nós”, de tempo histórico, de memória, de rupturas e continuidades devem fundamentar a construção de sujeitos capazes de perceberem-se como agentes históricos, éticos, que constroem sua emancipação e convivem com os diversos grupos sociais de maneira respeitosa e solidária.  
Em razão disso, a aprendizagem da História deve propiciar o situar-se na sociedade contemporânea para poder compreendê-la e perceber-se como cidadão. Os conteúdos trabalhados devem ser selecionados a partir de problemáticas contemporâneas, para que sejam significativos e possam fundamentar a construção da cidadania. A seleção de conteúdos deve refletir escolhas conscientes e compromissadas dos educadores, visando a formação ampla, ética e bem fundamentada dos educandos.
Fica claro que, no ensino de História é importante se trabalhar investigações históricas, propiciando ao estudante o contato com diversas fontes documentais. Através do estudo de documentos, através de processos de análise e interpretação, é possível relacionar questões atuais com questões das épocas estudadas, percebendo diferenças e semelhanças, rupturas e continuidades. É importante que o estudante desenvolva a capacidade de pensar de forma autônoma, sabendo pesquisar e propor soluções. O professor deve ser o mediador da busca do conhecimento, explicitando as dificuldades, favorecendo a interação e o trabalho coletivo.
Também é de suma importância o trabalho através de debates, o que favorece a utilização de argumentos, o saber posicionar-se e ouvir os argumentos dos outros, o que colabora na percepção das relações entre o ‘eu’ e o ‘outro’. A sala de aula, presencial ou virtual, deve ser espaço privilegiado para o debate, para a apropriação e sistematização de conteúdos e experiências.
Diante disso, o trabalho com os diversos temas e conceitos da História deve enfocar épocas diversas, para que o aluno possa lidar com a categoria temporal, percebendo mudanças e permanências nos processos históricos. A diversidade de fontes documentais – escritas, iconográficas, musicais  favorece a compreensão da importância das múltiplas linguagens.
Outro componente importantíssimo a ser destacado no ensino de História é a memória. Numa sociedade acelerada, consumista, imediatista, vertiginosa como a nossa, tendemos a esquecer nosso passado, nossas raízes, o que nos faz perder a identidade, não só como pessoas, mas como nação, como projeto coletivo de país.
Com isso, os alunos devem ser estimulados a relacionar o presente com o passado, resgatando os processos vivenciados, evitando uma percepção imediatista dos fatos e acontecimentos. Há que se refletir sobre o que é colocado oficialmente como o que deve ser lembrado e porque se silencia sobre tantos outros acontecimentos, que acabam ficando numa posição marginal. Sendo assim, é essencial o posicionamento diante de fatos presentes, interpretando-os em suas relações com o passado e pensar os processos de construção da memória social, refletindo sobre a memória socialmente constituída.
Do mesmo modo, o ensino de História pode ter por objetivo a ousadia, a mudança e, desse modo fazer com que aluno, professor e a comunidade participem na construção cotidiana da História. A partir da leitura do poema em análise torna-se possível estabelecer que o ensino de História deve fortalecer a noção de importância da coletividade, de construção da identidade e de pertencimento a uma sociedade, a um grupo social e a uma cultura.
Da mesma forma, que o autor ao levantar tais questionamentos, no poema, estabelece uma clara relação entre o estudo da história, uma primeira reflexão sobre a historicidade dos fatos submersos e a literatura. Em função dessa correlação, constatou-se a importância da História em nossa sociedade.

Considerações Finais

O estudo da história do ensino de História pode esclarecer muito mais do que se supõe sobre as questões que envolvem o trabalho de historiadores e de professores, bem como temáticas que nem sempre são respondidas pela observação direta e pela reflexão do cotidiano.
Diante desse contexto, a trajetória da História ensinada nas escolas não corresponde à da História como campo de conhecimento, ou seja, como ciência. Tal postura deveu-se ao período em que confundiu-se história-ciência com história-bíblica, onde a influência religiosa predominava nas escolas. Somente a partir do século XIX a História passou a se constituir como disciplina escolar, fortemente marcada por uma perspectiva nacionalista e sempre associada à História da nação.
  Sob outro enfoque, as relações entre literatura e história estão no centro do debate da atualidade e apresentam-se no bojo de uma série de constatações relativamente consensuais que caracterizam a nossa contemporaneidade na transição do século XX para o XXI: a crise dos paradigmas de análise da realidade, o fim da crença nas verdades absolutas legitimadoras da ordem social e a interdisciplinaridade.
O historiador não ajuda ninguém construindo uma refinada continuidade entre o mundo presente e o que procedeu. Ao contrário, necessitamos  de uma história que nos eduque a enfrentar descontinuidades mais do que antes; pois a descontinuidade, o dilaceramento e o caos são o nosso dote."
Conclui-se, com esta pesquisa, que o ensino de História constitui um campo complexo e caminhos que se bifurcam. Suas múltiplas relações com outras áreas de estudo, sua posição como instrumento científico e cultural indica a riqueza de possibilidades para o seu estudo e o quanto há para investigar.
É sobremodo importante revelar que se torna indiscutível a sintonia entre História e Literatura. As análises literárias buscam relacionar o fazer literário ao contexto histórico dos fatos e é considerável a relevância da historicidade dos acontecimentos sobre os livros.
Os estudos que envolvem literatura têm estimulado a investigação histórica desde a compilação da bibliografia até os debates que envolveram a construção da História naqueles momentos, permitindo a investigação de fontes diversas facilitando a compreensão desse processo.
Em síntese, História e Literatura constituem disciplinas que oferecem elementos em comum proporcionando excelentes desafios entre ambas. A compreensão de que a literatura, além de um fenômeno estético, seja uma manifestação cultural, reside na efetividade dos registros ocorridos com o homem na sua historicidade, seus anseios e suas visões do mundo, permitido ao historiador assumi-la como espaço de pesquisa.
Perguntado por um amigo sobre qual conselho dar aos jovens historiadores, Carlo Ginzburg respondeu: “Leiam romances”. Para o pesquisador e historiador italiano, a ficção auxilia a desenvolver o que ele denominou de imaginação moral, ou seja, aquilo que nos permite fazer conjecturas sobre os seres humanos. E para isso, a literatura fornece uma leitura repleta de possibilidades humanas.


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