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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Em busca do comportamento leitor

"Compare o ato de leitura com o que acontece quando se faz café:
O pó de café fica no filtro, fora do bule. As palavras escritas pelo autor ficam no livro... Fora do leitor.
Mas a água que passou pelo filtro deixa de ser água e passa a ter o gosto, o cheiro e a cor do que não está ali e aparentemente ficou de fora.
Um leitor nunca mais será a mesma pessoa depois de ler um texto. Ele pode gostar ou não, entender ou não, porém passará a ter o gosto, o cheiro e a cor do que não está ali e aparentemente ficou de fora."

Marco Antonio Hailer

O Açúcar (Ferreira Gullar)


O branco açúcar que adoçará meu café
Nesta manhã de Ipanema
Não foi produzido por mim
Nem surgiu dentro do açucareiro por milagre.

Vejo-o puro
E afável ao paladar
Como beijo de moça, água
Na pele, flor
Que se dissolve na boca. Mas este açúcar
Não foi feito por mim.

Este açúcar veio
Da mercearia da esquina e
Tampouco o fez o Oliveira,
Dono da mercearia.
Este açúcar veio
De uma usina de açúcar em Pernambuco
Ou no Estado do Rio
E tampouco o fez o dono da usina.

Este açúcar era cana
E veio dos canaviais extensos
Que não nascem por acaso
No regaço do vale.

Em lugares distantes,
Onde não há hospital,
Nem escola, homens que não sabem ler e morrem de fome
Aos 27 anos
Plantaram e colheram a cana
Que viraria açúcar.
Em usinas escuras, homens de vida amarga
E dura
Produziram este açúcar
Branco e puro
Com que adoço meu café esta manhã
Em Ipanema.