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quinta-feira, 15 de setembro de 2011

O Livro e a América

Oh! Bendito o que semeia
Livros... livros à mão cheia...
E manda o povo pensar!
O livro caindo n'alma
É germe — que faz a palma,
É chuva — que faz o mar.
                                                              
Castro Alves
 
Do livro: "Poetas Românticos

Curiosidade da Língua

Presidente ou presidenta?

Linguistas explicam a correção da palavra presidenta e mesmo a oposição vê no seu uso uma evolução dos costumes


A palavra “presidenta” existe na língua portuguesa desde 1872. E desde 1925 ela consta como verbete do dicionário Caldas Aulete. Mas quase um século depois de ser dicionarizado, o substantivo feminino de presidente ainda causa estranhamento e leva muitos leitores, que adota o uso do termo, a questionar sua correção ortográfica.
O principal argumento contra o uso de presidenta se baseia no fato de que na língua portuguesa existem os particípios ativos como derivativos verbais. Assim, quem ataca é “atacante” e não “atacanta”, mesmo em uma partida de futebol feminino. Dessa forma, o particípio ativo do verbo ser, que é “ente”, também não permitiria a flexão de gênero. Ela se daria apenas pelo artigo feminino que antecede a palavra.
Portanto, a forma correta, segundo essa teoria, seria sempre a presidente, como é a estudante ou a gerente. “Não existe estudanta porque ninguém reivindicou”, diz o linguista Marcos Bagno, professor da Universidade de Brasília. “Mas à presidenta, por ser um cargo único e muito importante, é mais do que justo que seja dado este direito.”
De acordo com as lexicógrafas Marina Baird Ferreira e Renata de Cássia Menezes da Silva, a origem de presidenta prende-se, é claro, ao vocábulo presidente, mas não por flexão e, sim, por derivação. “Houve a substituição da vogal temática (-e) pela desinência formadora do feminino em português (-a). Fato que se deu por analogia com inúmeras outras palavras da língua, como chefa e governanta”.
Para elas, não se trata de exceção, mas de uma possibilidade reconhecida pela história da língua. “Tal processo é possível no nosso idioma desde sempre, como se vê no substantivo feminino infanta, registrado na língua desde o século 13”, diz o parecer das lexicógrafas.
Para o professor da Universidade de Campinas Sirio Possenti a discussão é absurda. “Você tem um dicionário bom aí? Então, pronto”, responde à reportagem. Segundo ele, os termos “correção e aceitabilidade” não são universais, pois envolvem cultura ou política. “É correto? Pelos critérios das gramáticas e dos dicionários, sim. Mas é curioso que os que apelam para gramáticas para criticar “os livro” não aceitam as gramáticas quando abonam presidenta”, diz.
Possenti se refere à polêmica causada por um livro utilizado em 4.236 escolas públicas do País que considera como válida a expressão “nós pega o peixe”. Se outras palavras que ganharam o feminino por derivação, como mestra, monja, governanta e infanta não causam a mesma estranheza, qual o problema com a palavra presidenta?
A primeira resistência de muitas pessoas está na sonoridade. Como até hoje foi uma palavra pouco pronunciada, presidenta enfrenta uma barreira natural a ser superada pelo costume. Na Argentina, Cristina Kirchner prefere ser chamada de “presidenta” ou ainda “chefa de Estado”. No site da Casa Rosada, sede da Presidência argentina, ela é sempre tratada como “presidenta”.
Mas lá, talvez por já ter tido outra presidenta, a palavra não suscita o mesmo debate: praticamente todos os veículos de comunicação a adotam, mesmo os jornais de oposição, como o Clarin, chamam Cristina Kirchner de “presidenta”. “Os argumentos contrários (à palavra presidenta) podem vir da sua conotação política ou feminista”, diz o professor Possenti. “Se se tratar de problemas “de ouvido”, há duas soluções: ler mais ou ir ao otorrinolaringologista”.
De fato, menos de um ano depois do discurso da vitória de Dilma Rousseff, quando ela se anunciou publicamente como presidenta eleita, gerando a primeira onda de debates sobre o tema, a palavra começa a cair na rotina. Entre os políticos, poucos são os que não usam “a presidenta” (ou pelo menos não a usam ocasionalmente). A grande maioria o faz de forma natural, como o governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB). Mas outros dão a ela um sentido irônico, como um cacique do PMDB, descontente com Dilma, que se refere a ela como “essa presidenta”.

Disponível em: <http://migre.me/5HfnF>. Acesso em 15/09/2011.