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domingo, 19 de setembro de 2010

Como ensinar ortografia


Disponível em:<http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/pratica-pedagogica/como-ensinar-ortografia-594436.shtml>. Acesso em: 19.09.2010.

Para que os alunos escrevam dentro da variedade padrão é essencial conhecer as regularidades e irregularidades da língua e saber como aplicá-las.

Desde que o aluno recém-alfabetizado percebe que um mesmo som pode ser grafado com diferentes letras, ele passa a encarar dúvidas de ortografia. No livro La Calidad de las Escrituras Infantiles, as autoras Ana María Kaufman e María Elena Rodríguez explicam que isso se dá porque poucas letras cumprem o princípio alfabético de relacionar uma unidade sonora (um fonema) a apenas uma letra escrita (grafema).

Isso acontece porque a escrita é um sistema de representação construído historicamente e não um código. Se fosse um código de transcrição exato não existiriam grafias diferentes para sons iguais como ocorre com o fonema /s/ nas palavras "sapo", "assar", "cebola", "paçoca" e "auxílio".

Essas características da língua deixam de ser um problema para o estudante que consegue enxergar a ortografia atrelada às práticas sociais de linguagem, à leitura e à produção de textos. "Quanto mais oportunidades as crianças tiverem de escrever textos, maiores possibilidades terão de conquistar, pouco a pouco, o conhecimento da ortografia", defende Celia Díaz Argüero no livro
Aprender y Enseñar la Lengua Escrita en el Aula. E compreender as convenções ortográficas ajuda, e muito, já que elas unificam a maneira de escrever e facilitam a comunicação.
=== PARTE 2 ====
=== PARTE 3 ====
Regularidades e irregularidades ortográficas

Artur Gomes de Morais, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e um dos maiores especialistas do Brasil na área, explica no livro
Ortografia: Ensinar e Aprender como é feita a organização das regras ortográficas na língua portuguesa. De acordo com ele, existem palavras que mostram a relação entre letra e som de maneira irregular. A forma de redigi-las é definida na maior parte das vezes pela origem e deve ser memorizada. Já as relações regulares podem ser compreendidas e são divididas em três tipos:

- Regulares Diretas Incluem as grafias de P e B, T e D, F e V. Apesar de expressarem um único som, esses pares de letras são pronunciados de forma muito parecida, confundindo as crianças recém-alfabetizadas.

- Regulares Contextuais Aqui o uso de uma letra ou outra para um determinado som vai ser definido em relação à posição em que esta letra se encontra dentro da palavra. Nestes casos, é preciso avaliar o contexto em que a letra será utilizada - se no começo, no meio, no final da palavra, entre vogais, antes ou depois de determinadas consoantes, etc. - para definir sua grafia. Isso ocorre, por exemplo, no uso de C ou QU com som /k/ em palavras como "cavalo" e "quiabo".

- Regulares Morfológico-gramaticais São as correspondências determinadas por aspectos gramaticais na formação de palavras por derivação e na flexão de verbos. Entre os exemplos, estão os adjetivos que indicam lugar de origem, como "francesa" e "portuguesa", grafados com S (com som de Z). Também ocorrem com os verbos no infinitivo, que terminam com R (embora esse R não seja pronunciado em muitas regiões), ou na flexão da terceira pessoa do plural (em palavras como "fornecerão" e "forneceram").
Como ensinar os alunos a refletir sobre ortografia

TRABALHO EM DUPLAS
Para
decidir onde colocar cada palavra, as
crianças pensam sobre suas características

DEBATE COM A TURMA
Discutindo sobre a escrita, os alunos
construíram uma tabela coletiva
O ensino da ortografia tem sido marcado por dois extremos, ambos inadequados. De um lado, estão os professores que consideram que as regularidades e irregularidades devem simplesmente ser decoradas e, portanto, treinam seus alunos por meio de exercícios mecânicos de memorização de regras e de cópias dos termos. No outro polo, estão os profissionais que adotam a mera exposição dos alunos a textos diversos. Eles acreditam que o contato a longo prazo se incumbe de mostrar a grafia-padrão.

As pesquisas mais recentes indicam, no entanto, que grande parte da ortografia, mesmo sendo regida por regras, pode ser compreendida por meio de exercícios de reflexão - o que é muito diferente de apenas copiar e repetir
(leia a sequência didática).

O ponto de partida no trabalho com o tema será sempre um diagnóstico para identificar o que a turma já sabe e quais erros ortográficos são mais frequentes. Foi o que fez Elaine de Paula, professora do 3º ano da EM Agnes Pereira Machado, em Catas Altas, a 142 quilômetros de Belo Horizonte. No início do ano, ela realizou um ditado de nomes de animais para identificar as dificuldades da turma. "Havia muitas dúvidas, mas resolvi focar o trabalho no uso da letra R porque a maioria errava nesses casos", lembra.
Em seguida, ela preparou exercícios, começando com a classificação de palavras. "Desenhei uma tabela e pedi que eles relacionassem palavras de uma lista extensa com alguns itens: quando o R aparecia no início da palavra, entre vogais ou entre vogal e consoante, por exemplo, de acordo com as semelhanças", conta. Em duplas, fizeram a tarefa e, em seguida, compartilharam seus resultados com o restante da turma. Após a análise do trabalho, elas criaram regras para explicar as grafias e as discutiram. As conclusões foram várias: "Tem palavra que começa com um R, mas o som é de RR forte", "Não começamos nem terminamos palavras com RR" e "Um R entre vogais é fraco, a língua treme". A professora então redigiu no quadro essas frases e combinou que elas poderiam ser consultadas quando necessário.

Para levar à reflexão sobre os equívocos mais comuns, a professora Elaine seguiu uma das orientações do livro de Morais, propondo a classificação de palavras com grafias semelhantes e a produção de regras nas atividades com palavras organizadas em listas (isso é, não retiradas de textos). O autor sugere também outras duas maneiras de colocar à prova o que foi aprendido: atividades de reflexão sobre termos presentes em textos (como a releitura com foco em um aspecto e a reescrita com transgressão das regras aprendidas) e revisão de textos feitos pelos próprios alunos.

Essas reflexões vão ajudar os estudantes na compreensão dos casos regulares. Para se apropriar dos irregulares, porém, será necessário memorizar ou consultar um dicionário. Nesse momento, priorize as palavras de uso frequente, já que não faz sentido pedir que eles decorem a grafia de termos como "obsessão" e "ascensorista" só porque são típicos da complexidade da língua. O objetivo é que a turma se torne cada vez mais capaz de dominar as questões ortográficas que enfrentam em suas produções escritas.

Reportagem sugerida por 2 leitoras: Edna Cristina Oliveira Lima, Miguel Calmon, BA, e Mariana Demetrio dos Santos, Ilhéus, BA


Reescrita com transgressão ortográfica

Bloco de Conteúdo
Análise e reflexão sobre a língua e a linguagem
Conteúdo
Ortografia
Objetivos
- Refletir sobre princípios das normas ortográficas.
- Construir um repertório de regularidades ortográficas contextuais.

Conteúdo
- Ortografia: uso de E e I no fim de palavras pronunciadas com som de /i/.

Anos
3º e 4º.

Tempo estimado
Seis aulas.

Material necessário
Papel pardo ou cartolina e pincel atômico.

Flexibilização
Pensando em um aluno com deficiência auditiva, mas capaz de fazer a leitura orofacial, que já escreva bem e não utilize Libras – pois nesse caso sempre terá direito a um intérprete na sala, recomenda-se falar sempre de frente para a criança (regra que vale tanto para o professor, quanto para o colega da dupla). O aluno surdo deve sentar-se nas carteiras da frente da sala, próximo ao professor. Também é fundamental que você escreva na lousa todos os pontos a serem trabalhados, para que o aluno possa fazer seus registros. Isso facilita a compreensão, já que o aluno surdo terá o apoio visual da escrita. O professor também pode utilizar esses registros para trabalhar com o aluno as marcas da oralidade, combinando diferentes cores no quadro. Por exemplo: escreva em amarelo as transgressões (que normalmente poderiam ser apenas faladas) e em branco a forma escrita corrigida. O trabalho em duplas pode favorecer a colaboração para dificuldades específicas do aluno.
No caso de um aluno ainda em processo de construção da escrita, vale ampliar as atividades para a criança surda, ao trabalhar com ela alguns passos aquém do grupo, aproveitando para selecionar outras palavras, com erros comuns e próprios da deficiência. Outra situação comum nos casos de crianças com deficiência auditiva são as próprias alterações na escrita que podem ser aprimoradas com o exercício, mas que também precisam ser compreendidas como inerentes ao processo de aprendizagem dos surdos. Se o aluno ainda não é capaz de produzir textos, ele pode participar da sequência com listas e frases, usando o mesmo tema. Também é possível acrescentar figuras às palavras novas ou desconhecidas.

Desenvolvimento
1ª etapa
Com base nas produções dos alunos, defina com qual dificuldade ortográfica trabalhar. Essa sequência é focada no uso do E e do I, mas ela pode ser aplicada também com palavras terminadas com O e U com som de /u/ ("bambo"/"bambu", "tato"/"tatu", "urubu", "lobo", "cavalo" etc.) e outras regularidades. Escolha um texto conhecido pelos alunos e que tenha palavras terminadas em E e I com som de /i/ (como "leite", "perde", "perdi", "mente", "menti", "gente", "sapoti", "verde", "saci", "doce" etc.), faça um ditado dele e recolha as produções.

2ª etapa
Em uma lista, reúna as palavras escritas na 1ª etapa, inclua outras terminadas em E e I com som de /i/ e entregue-a para cada dupla. Peça que os estudantes analisem e discutam quais foram grafadas de maneira correta e as que podem ser descartadas. Diga que construam uma tabela, separando-as em dois grupos, de acordo com a escrita. Incentive-os a discutir também sobre o significado de cada palavra, como "qual a diferença entre ‘perde’ e ‘perdi’?". Terminada a atividade, peça que compartilhem seus registros. Seja o escriba de uma tabela coletiva, dividindo as palavras em duas colunas conforme o que eles dizem - quando houver divergências, peça que explicitem seus raciocínios. Discuta sobre onde aparecem as sílabas fortes nas palavras terminadas com E (penúltima ou antepenúltima sílaba) e nas com I (última). Sistematize as conclusões em cartazes para consulta.

3ª etapa
Selecione outro texto conhecido pelos alunos e tenha palavras terminadas com E e I. Realize um ditado.

4ª etapa
Diga que reescrevam o texto da 3ª etapa como se fossem alunos novos, que não estavam nas aulas anteriores e, portanto, não discutiram sobre o uso do E e do I. Essa tarefa parte do pressuposto de que, para transgredir uma regra, o indivíduo precisa ter conhecimento do que está violando.

5ª etapa
Devolva às crianças o ditado da 1ª etapa e peça que revisem os textos consultando os cartazes.

Avaliação
Analise as transgressões que os alunos fizeram na 4ª etapa, observando se foram intencionais ou aleatórias e se conseguiram errar de propósito o uso das vogais em questão no fim das palavras. Fique atento a outras dificuldades ortográficas que podem ser trabalhadas em propostas futuras. Nas demais produções escritas dos alunos, passe a avaliar o uso do E e I, sem deixar de analisar aspectos relacionados à compreensão daquilo que se pretende comunicar. Proponha que os alunos reescrevam corretamente seus textos, consultando o mural de regras sempre que tiverem dúvidas.
Fonte:
Adaptação da proposta elaborada por Artur Gomes de Morais no livro Ortografia: Ensinar e Aprender.
Flexibilização Daniela Alonso
Psicopedagoga, especialista em inclusão e selecionadora do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10.

Quer saber mais?
CONTATO
EM Agnes Pereira Machado, tel. (31) 3832-7104

BIBLIOGRAFIA
Aprender y Enseñar la Lengua Escrita en el Aula
, Alejandra Pellicer e Sofía Vernon (orgs.), 315 págs.,
 Ediciones SM, 199 pesos novos mexicanos (cerca de 28 reais)
La Calidad de las Escrituras Infantiles, Ana María Kaufman e María Elena Rodríguez, 152 págs, Ed. Santillana,
160 pesos novos mexicanos (cerca de 22 reais)
Ortografia: Ensinar e Aprender, Artur Gomes de Morais, 128 págs., Ed. Ática, tel. (11) 3990-2100, 36,90 reais


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